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16.8.10

Gasta-se 22 vezes menos com a saúde do que com fronteiras

 

Caso de cegueira em clínica ilegal voltou a colocar inspecção estatal em causa. A saúde está longe das áreas onde mais se investe, na Justiça só há dez inspectores, e mesmo no trabalho há carências

O Estado gasta anualmente mais de 220 milhões de euros com os vários serviços de inspecção, mas este número continua a ser insuficiente para cobrir as actividades que carecem de fiscalização. O caso da clínica de Lagoa, no Algarve, em que três doentes cegaram após uma operação aos olhos, reabriu o debate em torno desta matéria, com um dos sindicatos da função pública a denunciar, em declarações ao DN, que na Inspecção-Geral das Actividades em Saúde "deveria haver dez vezes mais inspectores que os que existem actualmente".

Segundo dados fornecidos pelas inspecções-gerais e ministérios ao DN, a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) tem um orçamento de cerca de quatro milhões de euros, o que é bastante inferior a outras áreas. Tal "bolo" significa, por exemplo, que o Estado gasta 22 vezes menos a fiscalizar a saúde do que as fronteiras e a imigração (o SEF tem um orçamento de cerca de 87 milhões).

Os gastos com a área da saúde ficam também muito aquém do valor investido na educação, onde o Estado gasta quase cinco vezes mais (15 382 922 euros) ou na inspecção laboral, onde o orçamento é doze vezes superior ao da IGAS (cerca de 48 milhões de euros).

As insuficiências na inspecção foram ainda comprovadas pelo DN, que nas últimas semanas apurou que existiam em Portugal 300 clínicas de saúde ilegais e que não havia uma fiscalização específica para as saunas do País, embora a ASAE inspeccione os ginásios.

O presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, Bettencourt Pincanço, garante que o caso de Lagoa revela que "toda a gente faz o que quer, abre as clínicas que quer e ninguém inspecciona nada. Na saúde deviam existir dez vezes mais inspectores e, enquanto isso não acontecer, as pessoas vão continuar a sofrer e até a morrer pelo País".

Por outro lado, a saúde não é a única área carenciada em termos de inspectores. Contactadas pelo DN, fontes das várias inspecções-gerais explicaram que, apesar da necessidade de aumentar o número de quadros na área da inspecção, os orçamentos "estão congelados".

Aliás, o próprio Executivo assume que há carências em algumas áreas, daí que a Autoridade para as Condições do Trabalho (antiga Inspecção-Geral do Trabalho) tenha em 2009 aumentado o seu número de inspectores em mais de 50%, tendo agora cerca de 400.

Mesmo assim, este é um número muito aquém de um défice que está identificado desde 1993, ano em que o então Instituto para o Desenvolvimento das Inspecções do Trabalho apontava para a necessidade de existirem 538 inspectores do trabalho em Portugal.

"A inspecção é uma das áreas em que a administração pública tem mais carências. Há menos inspectores do que é necessário e muitas vezes, a meio do ano, há equipas que querem sair para o terreno para inspeccionar e já não há dinheiro para pôr gasolina nos carros", denuncia Bettencourt Picanço.

Além do caso na clínica de oftalmologia no Algarve, tem havido outras situações que colocam em causa a inspecção. O mesmo aconteceu, por exemplo, no Verão passado na praia Maria Luísa, no Algarve, quando o desabamento de uma arriba matou cinco pessoas. A partir desse acontecimento foi reforçada a fiscalização, que fica a cargo da IGAOT (Inspecção--Geral de Ambiente e Ordenamento do Território), o mesmo organismo que permitiu, por exemplo, o polémico licenciamento do Freeport em 2002.

Outra situação em que houve, alegadamente, falhas na fiscalização foi no caso dos submarinos. De acordo com um relatório pericial do Ministério Público sobre o negócio - divulgado em Outubro de 2009 pelo jornal Público -, o Estado falhou na fiscalização das contrapartidas da compra dos submarinos alemães.

Nas organizações que, então, falharam foram incluídas a Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC) da Assembleia da República e as "tutelas ministeriais". Neste rol inclui-se a Inspecção-Geral de Defesa Nacional que fiscaliza, entre outras entidades militares, os vários ramos das Forças Armadas, bem como estabelecimentos fabris militares. Ainda assim, a Inspecção- -Geral de Defesa Nacional é dos organismos de fiscalização do Estado com menos meios, tendo um orçamento de apenas 1 701 675 euros e contando com uma equipa de 21 inspectores.

 

Tendo em conta as falhas na fiscalização que se têm registado nos últimos anos, o presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado - organização afecta à UGT -, Bettencourt Picanço, não tem problemas em apontar o dedo ao Executivo: "A responsabilidade é do Governo por não investir mais na inspecção."

O DN tentou por várias vezes ao longo da última semana contactar o Ministério das Finanças e da Administração Pública, tanto por e-mail como por telefone, para obter esclarecimentos, mas não obteve qualquer resposta.

 

Link: http://dn.sapo.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=1642069 

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